-Mamãe? – Rompi o véu que me envolvia, que me envolvera
durante tanto tempo, que me guardara, que me polira e transformara... Reneguei
aquele meu pequeno mundinho, solitário, guardado por mamãe, cuidado e
acariciado... Fugi por um instante do aconchego, do escuro, do barulho do vazio
e das risadas longínquas de mamãe, da voz de papai, das músicas que
embalavam-me... Dos sons do meu coração, dos sons do coração dela... Rompi com
minha pequena visão, busquei a luz no final do túnel... Rompi o véu que me
guardava, o véu que me educava. – Mamãe? – Eu gritei quando saí... Mas não
havia mais ninguém, não havia nada além de luz, não havia nada além de imensos
olhos, não havia nada além de sons, não mais corações, mas titaques, mas
barulhos de maquinários; não estava mais quente, agora era tudo frio... Havia
dezenas de olhares, todos sorriam, falavam coisas que eu não conseguia
entender, me passavam de lugar para lugar, me molharam, me envolveram num novo
véu – Mamãe? – Eu tentava chamar, mas ninguém me ouvia... – Mamãe? – Eu buscava
com o olhar, eu ansiava voltar para onde eu estivera, anelado, cuidado,
exortado... – Mamãe? – Fui passado por todos... Até estar ali, ao lado do toque
de seu coração, anelado por seus braços, ao ouvir a voz de papai, ao sentir o
calor de mamãe... Mas agora, já era hora de partir... Rompi o véu que me
envolvia, durante tanto tempo, que me guardara, que me polira, que me
transformara e educara... – Mamãe? – Eu disse, mas não mais a achei, agora
tinha eu que ser mamãe, tinha eu meu próprio véu... A família.
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