segunda-feira, 23 de abril de 2012

O Mancebo...

A frente da porta de entrada havia um tapete com a seguinte inscrição "Seja bem-vindo"; quem pela porta passava de fato bem-vindo era, serviam-lhe chá, riam de suas piadas, serviam-lhe bolo, conversavam, perguntavam-lhe sobre a vida, diziam-lhe o quanto tiveram o prazer da visita, despediam-se e tudo ali voltava a ser como era antes... Havia tornado-se uma rotina, sempre os mesmos assuntos, as mesmas perguntas... Mas uma pergunta repentina levou a família, dona da casa, a um enorme conflito... "Onde coloco meu casaco?" Uma senhora perguntou, ela era riquíssima, da alta sociedade, sempre falando os prós e os contras das casas de suas "amigas" para outras "grandes amigas"... Para a família, em especial a mulher da casa, não ter uma resposta à pergunta seria inadmissível, deveriam parecer prontos para qualquer ocasião, qualquer detalhe, mas sorridentes, sem saber o que fazer pegaram um cabo de vassoura qualquer e espetaram num vaso de flores, disfarçando-o o máximo possível
-Deixe seu casaco aqui Madame...
-Oh céus - Ela analisou o objeto, olhou de cabeça inclinada, andou ao redor do vaso, tocou-o, cheirou-o, pensou até em sentir o gosto, mas seria estranho demais - O que seria isso?
-É uma... Um... - A mãe enrolava-se, mas a empregada rapidamente, cortando cebolas não tão longe dali resolveu ajudá-la, falou a primeira coisa que lhe veio à mente, uma mão... Uma cebola... 
-É um mancebo, Madame... - A rapariga enxugou as mãos e disse fazendo reverência
-Mas que diabos! - A família assustou-se quando a Madame bradou - ADOREI!
      Assim, como todas às vezes seguiram a rotina, serviram-lhe chá, riram de suas piadas, serviram-lhe bolo, conversaram, perguntaram-lhe sobre a vida, disseram-lhe o quanto tiveram o prazer da visita, despediram-se e tudo ali voltou a ser como era antes...  Passaram-se os meses e o tapete de boas-vindas há tempos não era mais pisado, ocorria uma pequena reforma na residência, por isso não receberiam visitas logo... A sala permanecia vazia, os quadros empoeirados, o tapete estava sujo de tinta... E o mancebo? Permanecia ali de lembrança... A família queria mais ajustes, para parecerem ainda mais ricos, com uma das casas mais bonitas, nem que já ninguém pudesse entrar lá e tirá-los do tédio...
       O pequeno telefone cromado com toques de um material semelhante à textura de uma rocha de granito salmão tocou histericamente, a filha mais nova rapidamente atendeu, estava aflita ultimamente, escondendo o namoro dos pais com o Pedrinho da padaria, por isso era sempre a primeira a atender ao telefone... Do outro lado da linha a voz irritante da Madame soou "Quero que venham visitar-me" ela dizia animada, explicou que não poderiam visitá-los, mas ela poderia ser visitada... Sem mais nada o que fazer aceitaram o convite e foram a tal mansão da mulher... Não era muito diferente do comum, um carpete escarlate sobre o assoalho, um sala gigantesca, com obras famosas de esculturas e quadros, haviam vasos de flores, e a frente deles algo semelhante a um cabo de vassoura repleto de outros pequenos cabos espetados, todo feito de ferro, próximo a porta de entrada...
-Podem colocar os seus casacos nesse mancebo, comprei diretamente de Paris... - A mentira da família havia incomodado a inveja da Madame de tal forma que resolveu mandar que lhe fizessem um tal mancebo melhor e mais prático, ela não percebeu como foi enganada, pois sua ganância foi maior do que sua inteligência... Depois daquele dia, o mancebo surgiu na casa de diversas madames, tornou-se uma tendência nos países europeus... O Mancebo vestiu casacos de pele até que fossem proibidos, usou cachecóis, cacharréus, chapéus de todos os tipos, cores e tamanhos, vestiu Prada e Chanel, linho e couro... Foi usado pelo mais pobre e pelo mais rico, caiu no gosto do povo... O mito do cabo de vassoura num vaso qualquer, tornou-se rotina na casa de todos... Inclusive da família em questão... Que aderiram à própria moda que por acidente criaram.... Mas o mancebo... No fim de tudo... De tantas roupas... Tornou-se apenas um escravo do consumismo...


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